Lu Gomes (*1950 - +2018)
Conheci o Lu Gomes nos anos 1970. Eu estudava Jornalismo na FAAP e vivia intensamente a vida universitária, criando parcerias e desenvolvendo projetos pessoais com quem estivesse disposto a sacudir a vida. Um desses projetos foi a Boca, uma revista "underground" de quadrinhos. Eu tinha uma ideia de fazer uma história que satirizasse o universo Disney e procurava um desenhista. Um amigo, Gilberto Epstein, me indicou o desenhista Lu Gomes.
Arte da HQ "Os Porões de Patrópolis", na revista Boca |
Com o tempo percebi que o Lu era ainda melhor do que aparentava à primeira vista. Muito criativo, combinava dois talentos - desenhava e escrevia. Eu logo passei a ser uma espécie de sparring dele, sempre exigindo que ele se superasse no que fazia de melhor. O Lu revelou-se ainda um músico com coragem para se apresentar no palco do antigo Lira Paulistana ao lado de Roberto Navarro e Regina Rheda, com a banda Esquadrilha da Fumaça. E virou ator no curta O Grotão (dirigido por Flávio Del Carlo em 1980), A Festa (de Ugo Giorgetti, 1989) e vários comerciais.
Arte de Lu Gomes |
A partir dos anos 1990, 0 Lu partiu para uma surpreendente carreira jornalística. Foi editor no Jornal da Tarde e na revista IstoÉ. Fez matérias sobre uma de suas paixões, a aviação militar. Colaborou também com publicações da editora Abril, especialmente a Playboy.
Lançamento de Guerra Nuclear no Rádio Clube, São Paulo, 1986 |
Mas chegou um momento em que o Lu, com todos os seus talentos e habilidades, se perdeu. Eu continuei no meu papel de sparring, tentando fazer com que ele saísse de sua crise profissional sem fim - e no processo, cuidasse um pouco mais de sua saúde. Não consegui nem um dos dois. Tudo o que o Lu fez nesse período eram ilustrações eróticas, com pin-ups meio conceituais. Uma delas virou capa do primeiro livro erótico da minha mulher, Lidice Ba.
Capa de Yves Ribeiro, ilustração de Lu Gomes |
Vieram então as dores nas pernas. A princípio todos achavam que era uma trombose. Era, mas descobriu-se no Hospital das Clínicas que o Lu tinha as duas cabeças de fêmur fraturadas há muito tempo. Um dos meus últimos diálogos com ele foi tentar desvendar o mistério daquelas fraturas. Nem ele se lembrava como aquilo tinha acontecido.
Com uma única parente próxima, a prima Mônica Inês Elias Jorge (que garantiu sua sobrevivência nos momentos mais difíceis), o Lu se isolou sem perspectiva. Mas a cada encontro eu percebia seu humor e conexão com a realidade intactos. Na última hospitalização as coisas se complicaram definitivamente. No fim, descansou. Coloquei um CD de Frank Zappa no seu caixão para que ele parta bem acompanhado.
Este vídeo tem problemas de sincronização, mas me parece uma boa despedida do Lu, numa mensagem ao amigo e parceiro Rogério Naccache. Seu último adeus vale para todos nós:
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